A universitária morreu em março, em Samambaia. Inicialmente, o caso era tratado como morte acidental causada por engasgo. Uma reviravolta na investigação colocou atrás das grades o namorado dela. Marcus Renato teve a prisão temporária convertida em preventiva
Gritos, violência e omissão. A morte de Elaine Vieira de Jesus Dias, 35 anos, inicialmente tratada como um engasgo, ganha novos capítulos. A investigação da Polícia Civil do DF (PCDF) comprovou que a mulher foi vítima de feminicídio ao ser asfixiada pelo namorado, Marcus Renato de Sousa da Silveira, 44, preso em julho deste ano. O inquérito policial foi concluído e traz detalhes inéditos sobre o assassinato da universitária. Marcus estava preso temporariamente e teve a prisão convertida em preventiva pela Justiça na sexta-feira (8/9).
Elaine morreu na madrugada de 22 de março, dentro da casa de Marcus, em Samambaia. O casal estava junto havia nove meses, mas a relação era regada de brigas, segundo relataram testemunhas. No primeiro depoimento prestado à polícia, o técnico de informática afirmou que havia discutido com a mulher cinco dias antes, em 18 de março, e Elaine decidiu sair de casa. No dia 22, a mulher teria postado uma foto nas redes sociais em um bar, o que teria incomodado o companheiro.
Marcus passou a ligar para Elaine de forma insistente, até que uma das ligações foi atendida por um amigo da universitária. Pelo telefone, o colega de Elaine afirmou que estava tudo bem e Marcus exigiu que a chamada fosse de vídeo. Pela câmera, o agressor viu que a namorada estava deitada e embrulhada em uma coberta. Tomado pelo sentimento de posse, ele pediu que Elaine voltasse para casa.
A noite do crime
Elaine saiu do Sudoeste, onde mora o amigo, com destino à casa de Marcus, em Samambaia. Ela chegou em um carro de transporte por aplicativo. Na noite de 22 de março, o casal discutiu. Apesar de Marcus afirmar que a conversa teria ocorrido de forma amistosa, depoimentos cruciais colhidos ao longo da investigação desmentem a versão do feminicida.
Marcus teria visto no celular de Elaine uma conversa entre ela e uma amiga. Na ocasião, a amiga aconselhava a mulher a se encontrar com um rapaz. Ao ler as mensagens, o técnico decidiu ligar para a colega de Elaine e tirar satisfação. Embora tenha negado o fato na delegacia, a mulher alegou que o telefonema durou cerca de 10 minutos e foi xingada por Marcus de “piranha” e “vagabunda”.
Em depoimento, Marcus contou que, naquela noite, Elaine chegou embriagada, se arrastando pelo chão e caiu por três vezes no portão. Disse ainda que os dois conversaram e ele saiu para limpar a área, enquanto Elaine pegou um prato com comida e foi para o quarto comer. Ainda de acordo com o acusado, ela derrubou o prato e desfaleceu ao se engasgar com um pedaço de carne.
Com base nos depoimentos, a polícia descobriu que houve um intenso conflito entre Elaine e Marcus na madrugada em que ela sofreu a parada cardiorrespiratória. Uma vizinha ouvida pelos investigadores relatou que foi uma “baixaria só”, ainda acrescentando ter escutado muitos gritos de uma voz fina.
Marcus foi o responsável por acionar o socorro. Uma das profissionais de saúde que foi até o local disse ter encontrado o portão fechado. As equipes precisaram tocar a sirene e bater na porta por diversas vezes. Marcus só apareceu depois de cinco minutos. Os socorristas detalham, ainda, ter encontrado um cenário “esquisito”. O único pedaço de carne visto pela equipe foi uma enorme fatia de bife que, segundo os profissionais, seria impossível de ser engolido por qualquer pessoa.
A hipótese de engasgo por alimento foi descartada por médicos. Com base no depoimento de uma médica, seria improvável que a vítima tenha se engasgado, pois não há elementos indicativos para essa ocorrência, uma vez que não foi observado nenhum resto alimentar na via aérea durante a intubação.
O laudo de exame cadavérico concluiu que o óbito de Elaine se deu por asfixia de origem não determinada. Contudo, a presença de inúmeras lesões na região cervical indica esganadura. O Delegado Marcos Miranda, da 26ª Delegacia de Polícia (Samambaia Norte), explicou que elementos coletados após a prisão do suspeito vieram a reforçar o crime de feminicídio por esganadura. “As testemunhas ouvidas durante a investigação fizeram cair por terra a narrativa de engasgo criada por Marcus Renato”, afirmou.
O Ministério Público denunciou Marcus Renato por homicídio qualificado por feminicídio, motivo torpe e asfixia. O juiz da Vara do Tribunal do Júri determinou a prisão preventiva do acusado.