Recentemente, o Universo Paulinas divulgou o artigo “Para incluir as Mulheres no Orçamento, é preciso enfrentar o Sistema da Dívida”, escrito pela coordenadora nacional da Auditoria Cidadã da Dívida (ACD), Maria Lucia Fattorelli, que destaca que o Sistema da Dívida consumiu 43,23% de todos os gastos do orçamento federal de 2023 (R$ 1,89 trilhão), valor equivalente a 12.662 vezes o volume de recursos destinados para o Ministério das Mulheres.
- por Maria Lucia Fattorelli
Maria Lucia Fattorelli. Foto: Arquivo Pessoal
Sou feliz porque tenho me dedicado a contribuir para a luta das Mulheres e todas as demais lutas por Direitos Sociais no Brasil denunciando o privilégio do Sistema da Dívida, que fica com a maior parte dos recursos do orçamento federal, sacrificando o atendimento a todos esses direitos fundamentais.
Em janeiro de 2023, foi criado o Ministério das Mulheres, o que reavivou a esperança de uma retomada do protagonismo do gênero feminino na política, pois deveria se refletir em um montante significativo de recursos para as políticas voltadas para as mulheres.
Analisando-se o orçamento do Ministério das Mulheres em 20231, verifica-se uma dotação de R$ 149 milhões para diversas ações importantes, como a Casa da Mulher Brasileira, Centros de Atendimento às Mulheres em Situação de Violência, Promoção e Defesa de Direitos Humanos para todos, Políticas de Igualdade e Enfrentamento à Violência contra as Mulheres, dentre outras.
Porém, considerando o valor efetivamente destinado no ano de 2023 (e os restos a pagar liquidados até o dia 27/3/2024), verifica-se que haviam sido “liquidados”2 apenas R$ 27,5 milhões, ou seja, apenas 18% da dotação que havia sido destinada.
Se por um lado o Ministério justifica tal situação citando a herança de “desmonte nas políticas para as mulheres”, e que tais ações também dependiam de estados, municípios e do judiciário3, por outro lado, não há atraso de um dia sequer ou qualquer outro empecilho para os gastos com a chamada dívida pública sem contrapartida em investimentos, como já declarou o Tribunal de Contas da União4, e repleta de ilegitimidades e ilegalidades já comprovadas em diversas investigações realizadas pelo Congresso Nacional5 e pela Auditoria Cidadã da Dívida.
O Sistema da Dívida consumiu 43,23% de todos os gastos do orçamento federal de 2023 (R$ 1,89 trilhão)6, valor equivalente a 12.662 vezes o volume de recursos destinados para o Ministério das Mulheres.
Quando se trata de cumprir, por exemplo, as metas do “arcabouço fiscal” e de “superávit primário”, instrumentos destinados a garantir o privilégio dos gastos com o Sistema da Dívida e ao acompanhamento constante dos compromissos com seus rentistas, relatórios bimestrais e uma série de controles periódicos e sistemáticos funcionam a pleno vapor e sem qualquer atraso.
Para 2024, a dotação do Ministério das Mulheres aumentou para R$ 472 milhões, porém, até o dia 27 de março, haviam sido empenhados apenas R$ 25 milhões, ou 5,3% da dotação. E somente haviam sido pagos R$ 4,3 milhões, ou 0,9% da dotação.
No mesmo período, dos R$ 2,5 trilhões previstos para o pagamento de juros e amortizações da dívida pública em 2024, já haviam sido pagos R$ 739 bilhões, ou 30% da dotação, e absurdos 60% de todos os recursos pagos pelo governo federal até essa data.
A disparidade de recursos é chocante: de um lado, as políticas para as mulheres e várias outras áreas sociais, cujos recursos são ínfimos e gastos a conta gotas, e de outro lado, os recursos destinados para o Sistema da Dívida, são abundantes e sem limite algum.
Enquanto não enfrentarmos o Sistema da Dívida, seguiremos destinando a maior parte do orçamento para essa chamada dívida pública, que tem servido apenas para financiar os mecanismos financeiros de transferência de recursos para rentistas e sugar recursos do orçamento7.
A ferramenta hábil para enfrentar o Sistema da Dívida é a auditoria integral, com participação da sociedade. Essa é mais uma tarefa que demanda a atenção de todos os movimentos que lutam por direitos da mulheres, convidadas a integrar a Campanha Nacional por Direitos Sociais8, que visa articular e fortalecer todas as lutas sociais em nosso país.
1. https://www1.siop.planejamento.gov.br/painelorcamento/
2. O termo “liquidado” se refere a recursos cujos serviços correspondentes já foram efetivamente prestados.
3. https://g1.globo.com/politica/noticia/2023/12/17/perto-do-fim-do-ano-ministerio-das-mulheres-empenhou-apenas-6percent-do-orcamento-para-casas-da-mulher-brasileira.ghtml
4. https://auditoriacidada.org.br/conteudo/cartilha-auditoria-da-divida-publica-ferramenta-fundamental-para-garantir-transparencia-correta-aplicacao-dos-recursos-publicos-e-desenvolvimento-socioeconomico-do-brasil/ - Página 13.
5. https://auditoriacidada.org.br/conteudo/clique-aqui-para-saber-como-foi-a-cpi-da-divida/
6. https://auditoriacidada.org.br/conteudo/artigo-no-extraclasse-defende-veracidade-do-grafico-da-acd/
7. https://auditoriacidada.org.br/conteudo/a-mentira-do-deficit-orcamentario-por-rodrigo-avila/
8. https://auditoriacidada.org.br/campanha-nacional-por-direitos-sociais/
Maria Lucia Fattorelli é auditora-fiscal aposentada da Receita Federal, coordenadora nacional da associação Auditoria Cidadã da Dívida, membro da Comissão Brasileira Justiça e Paz e do grupo de análise de conjuntura da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB).
Leia o artigo na íntegra no Universo Paulinas.
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