Fátima Pacheco Jordão
Socióloga e especialista em análise de informação.

A televisão aberta brasileira experimenta hoje, uma disputa real e acirrada por segmentos de consumidores de baixa renda, ao mesmo tempo em que busca definir, para os mercados mais sofisticados, as televisões fechadas, por cabo.

No entanto, nesse novo encontro entre audiências populares e a mídia, as regras começam a mudar. A televisão enfrenta, pela primeira vez, a concorrência real de novos meios que disputam as audiências populares.

É impressionante o crescimento de leitura da mídia impressa popular. A circulação de revistas populares voltadas para um público de leitores de baixa renda, como Ana Maria, Carícia, Malu, aumentou 70% nos últimos 3 anos. Ocorreram lançamentos e reformas de jornais mais populares com conteúdos abrangentes como os jornais Extra e O Dia, no Rio, e Agora e Diário Popular em S.Paulo. Essa ampliação de públicos, onde o segmento feminino teve papel estratégico, foi um dos fatores que garantiram um crescimento médio de 7% ao ano da circulação dos jornais entre 90 e 99 no Brasil. Fato inédito, no panorama internacional.

À parte essa nova concorrência entre os meios de comunicação, não se pode deixar de contabilizar as legiões de alunos que se incorporaram ao ensino médio e superior nos últimos anos. Inevitavelmente, forma-se nesses segmentos um público mais informado e crítico, a constituir um fator a mais de novas exigências sobre os meios de comunicação.

Neste momento a lógica de crescimento da mídia é mais complexa do que a simples agregação de audiências e coloca-se a necessidade de um ajuste inédito que implica a construção de legitimidade e credibilidade para seus conteúdos.

É da tradição da mídia eletrônica brasileira, sobretudo do rádio, a cobertura de problemas locais, seguida da pressão sobre os órgãos e empresas em busca de soluções para as suas audiências. Mais recentemente, em seus programas regionais, a TV Globo desenvolveu uma editoria específica e um jornalismo fortemente voltado para as comunidades e suas organizações locais.

Em um processo convergente, os grupos organizados nas comunidades, majoritariamente liderados por mulheres, têm buscado capacitação e treinamento para lidar com os meios e têm fortalecido suas posições como fontes estratégicas para jornalistas e comunicadores.

De outro lado, grupos como Tver, liderado por Marta Suplicy em S.Paulo, ou o Centro de Mídia para Crianças e Jovens, dirigido, entre outras, pela ex-diretora de programação da TV Cultura de S.Paulo, Beth Carmona, têm agregado um componente de crítica à televisão com grande potencial de desenvolvimento e influência.

Com o tempo, tais ações tendem a ganhar mais amplitude e ressonância, na medida que não são apenas o resultado da reflexão e da crítica de correntes isoladas, mas sim de preocupações que já se percebem nas grandes audiências.

Em pesquisa de opinião publicada pela agência de publicidade Propeg (Fala Brasil, 1998), as atitudes da população brasileira frente à televisão eram inequívocas e críticas, apesar dos grandes índices diários de audiência do meio. Mais de 87% reclamavam do excesso de sexo, de abusos em programas de auditório tipo mundo cão, de excesso de violência, inclusive nos noticiários.

Novos valores de cidadania emergiram: 80% dos entrevistados concordaram com a opinião de que “de uma maneira geral, a mulher é tratada como objeto sexual na televisão” e 82% com que “o negro sempre aparece numa situação de inferioridade”.

São posturas sinalizadoras de novos horizontes para a mídia. Isso, sem contar os novos impactos da nova mídia - a Internet. Essa é uma outra estória, mas que também leva mais água para o moinho da formação de audiências cidadãs.

O movimento organizado de mulheres não esteve parado a meio dessas transformações. Ao contrário. Só que, daqui para a frente, talvez precise correr mais.


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