Deputado Federal
Arlindo Chinaglia (PT-SP)

Dez milhões de brasileiros com mais de 16 anos estão desempregados.

O desemprego é disparado um dos maiores temores no Brasil, 73% dos pesquisados pelo jornal Folha de São Paulo, em junho passado, consideram que medo de ser demitido, ou "é uma das coisas" que mais atemorizam, ou é "o que mais dá medo".

O desemprego não ataca apenas os indivíduos, penaliza suas famílias.

A Constituição Federal de 1988 em seu Capítulo VII, "Da Família, da Criança, do Adolescente e do Idoso", equiparou os homens e as mulheres em relação a seus deveres, e benefícios, decorrentes da vida em comum. O Art. 226, parágrafo 5°, estabeleceu que "os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal são exercidos igualmente pelo homem e pela mulher". Estabeleceu ainda, no Art. 227, que "é dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança", "com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação" entre outras preocupações.

Nada mais justo. As sociedades modernas, hoje, reconhecem no homem e na mulher responsabilidades iguais na concepção e nos cuidados das crianças. E, ao Estado, também, parcela específica desta atenção.

No Brasil, apoio ao planejamento familiar, maternidade e paternidade responsáveis, políticas sociais positivas em atenção às crianças, devem sair do terreno da retórica e passar a compor, como itens fundamentais, a agenda social do país.

Sob esta perspectiva apresentei o projeto-de-lei nº 3.829/97, estabelecendo garantias no emprego do trabalhador diante da gravidez de sua esposa ou companheira.

Este projeto é particularmente importante nesta virada do século. Vivemos sob a crueldade social de um desemprego avassalador atacando as condições de sobrevivência da maioria da população. No Brasil, a destruição dos postos de trabalho pela economia dirigida pelos interesses dos grandes grupos financeiros internacionais, soma-se a um Governo Federal subserviente a estes grupos e incapaz de produzir políticas sociais. Pelo contrário, a irresponsabilidade de FHC e seus ministros atingiu níveis inaceitáveis de descaso social: dados sócio-econômicos brasileiros escancaram as conseqüências do desemprego e da grotesca concentração da riqueza. A marginalização e a exclusão de amplas parcelas da população, começando com crianças na tenra idade, é visível em cada esquina de nossas cidades.

Nos últimos cinco anos, os anos do Real, não só cresceu o desemprego, ampliou-se a informalidade no mercado de trabalho. Em ambos aspectos, as mulheres levaram a pior. Só em janeiro passado, na região metropolitana de São Paulo, os dados da pesquisa SEADE/DIEESE mostraram que a taxa de desemprego total foi de 16,2% para os homens, e de 19,9% para as mulheres. No Brasil todo, se considerarmos os dados do IBGE de 1995, as mulheres constituíam 40,1% da população economicamente ativa, mas representavam 32,5% dos trabalhadores empregados e destas apenas a metade tinham a carteira assinada.

Aumentou o tempo que os trabalhadores ficam sem emprego e sem renda. Na pesquisa da Folha de São Paulo, de junho, ficou estampado também que aumentou o tempo que os trabalhadores, homens e mulheres, estão ficando sem trabalho. Além de um em cada três brasileiros e brasileiras já terem perdido o emprego, pelo menos uma vez nos últimos cinco anos, ficaram muito mais tempo sem uma nova oportunidade de trabalho. Se tinham entre 25 e 34 anos no momento do desemprego ficaram desempregados um ano e meio, na média. Se tinham entre 35 e 49 anos, passaram-se dois anos e três meses até um novo emprego. São pessoas que já constituíram famílias, estão tendo filhos.

Tenho assistido o desespero de milhares de trabalhadores ao perder o emprego tendo a companheira grávida. E, de mulheres grávidas, angustiadas não só pelo próprio risco de desemprego, mas com a demissão do companheiro e pai da criança. São casos de gravidez tranqüila tornando-se uma gravidez tensa e até de risco. Milhares de trabalhadores, futuros pais, tem sido desempregados no momento que mais precisam de seus salários, jogando também sobre a mãe e à criança ainda em gestação as agruras da sua demissão.

O Projeto-de-Lei 3829/97 busca atuar efetiva e positivamente sobre estas realidades. Ele estabelece que durante a gravidez da mãe e nos primeiros três meses de vida da criança, seu pai tenha garantido o posto de trabalho. Poderá o trabalhador-pai, assim, ter condições financeiras para assegurar à criança, um teto, roupas, remédios, contribuindo com sua parcela para que a mãe e o bebê tenham os mínimos cuidados.

A legislação que estabeleceu a proteção do emprego à mulher em caso de gravidez, não foi, nem é, um privilégio. Buscou-se a proteção da criança, de acordo com a Constituição. Mas, esta proteção à criança recai exclusivamente sobre a mulher.

Além dos números já apresentados, um perfil mais detalhado da Fundação SEADE, em 1996, mostrava que da população ocupada na região metropolitana de São Paulo, 58,5% eram homens. Pouco mais da metade, 27,7%, tinham carteira assinada. Já as mulheres compunham 41,5% da população ocupada e apenas 14,8% delas tinham carteira assinada. Uma demonstração da discriminação das mulheres no mercado de trabalho.

Além da maior informalidade, as mulheres sofrem no mercado de trabalho com uma renda, na média, menor do que a dos homens. Em 1997, pesquisa no Distrito Federal mostrou um rendimento feminino correspondente a 65% do masculino. Isto significa que mesmo com a mulher trabalhando, parte importante da renda familiar vem do trabalho do homem. O que amplia os estragos sociais decorrentes da perda do emprego masculino, no momento em que a família está esperando uma criança ou acaba de incluir um recém nascido.

E reforça os argumentos de que a proteção das crianças se faça através da responsabilidade compartilhada entre homens e mulheres, com o consenso da sociedade.

Quero rebater, de pronto, uma falsa contestação ao projeto. A garantia de emprego ao trabalhador diante da gravidez da companheira não é um novo imposto, não vem onerar os custos da produção, não cria um novo privilégio. Simplesmente, trata de estabelecer que as empresas tratem homens e mulheres com mais igualdade em nome da proteção das crianças. Além do mais, a segurança oferecida aos trabalhadores que se descobrem futuros pais, trará benefícios em termos de desempenho e de produtividade da própria empresa.

A proteção da criança precisa deixar de ser um ônus exclusivo da mulher. É uma responsabilidade a ser dividida, com isonomia, entre o homem e a mulher. E que deve contar com o reconhecimento e o apoio de políticas públicas pelo Estado.

Assim, também, cabe a sociedade brasileira exigir e pressionar tanto o Estado, quanto as empresas, que assumam suas parcelas de responsabilidades em relação as gerações futuras, e que se cumpram os preceitos do Art. 227 da Constituição. É preciso o debate sobre a responsabilidade social das empresas e superar a simplificação maliciosa das "contribuições sociais" generosamente descontadas do imposto de renda empresarial e apregoadas em eventos para efeitos publicitários. As empresas ao aceitarem garantir o trabalho para os homens cujas companheiras estiverem grávidas, estarão fazendo um enorme contribuição social, estarão assumindo uma responsabilidade com o futuro.

Não podemos mais aceitar crianças jogadas na miséria desde sua concepção, não podemos mais aceitar desculpas para uma discriminação ainda maior das mulheres no mercado de trabalho. É preciso encarar com seriedade o futuro da gente deste nosso país.

Para que o Projeto-de-Lei 3829/97 tenha parecer e votação favorável na Comissão de Trabalho da Câmara dos Deputados é necessário um trabalho de convencimento que já vem sendo feito. E bem feito. Mas, em agosto teremos de fazer um esforço redobrado.


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