Por Gilda Cabral e Priscilla Brito

A partir de 2013, parlamentares e sociedade ficarão totalmente dependentes do Governo Federal para ter acesso a informações sobre o Orçamento da União. No mesmo ano da publicação da Lei de Acesso à Informação Pública (lei nº 12.527/2012), o Governo atua no sentido de decidir sozinho sobre os recursos públicos, com autonomia frente à população. Essa manobra tem como efeito colateral o sacrifício da transparência e do controle feito pela sociedade civil. Para nós, significa o fim do Orçamento Mulher.

No Plano Plurianual (PPA) 2012-2015, que define o planejamento orçamentário governamental para quatro anos, já houve uma grande agregação dos Programas. Em vez de serem orientados para a resolução de problemas específicos, os programas passaram a ser grandes guarda-chuvas, que se confundem com a área de atuação do ministério responsável.

O Ministério da Saúde, por exemplo, passou a ter como único programa temático o de número 2015, intitulado “Aperfeiçoamento do Sistema Único de Saúde (SUS)”. A partir do novo PPA, os antigos programas viraram objetivos, que por sua vez não têm correspondência na Lei Orçamentária Anual (LOA), o que impede que cada ação seja acompanhada individualmente.

Assim como ocorreu com os programas temáticos dos ministérios, as ações orçamentárias também foram aglutinadas, de modo a formar ações com enunciados mais gerais que impedem uma identificação clara daquilo a que se referem. Trata-se de uma mudança que dá mais autonomia aos gestores dos órgãos públicos, que passam a ter mais liberdade para remanejar recursos para diferentes finalidades. Por outro lado, torna impossível o nosso acompanhamento do que é feito pelo Governo com os recursos públicos.

Para tentar detalhar um pouco mais as ações, o Ministério do Planejamento sugeriu aos ministérios e demais órgãos a criação de Planos Orçamentários (POs). Esse mecanismo tem vários problemas em termos de transparência de informações. O primeiro é seu caráter facultativo: os ministérios não têm obrigação de apresentar Planos Orçamentários e, consequentemente, raríssimos o fazem. Além disso, é possível alterar o Plano ao longo da execução do orçamento, bastando uma autorização da Secretaria de Orçamento Federal (SOF). Por não fazerem parte da Lei Orçamentária Anual, nenhuma mudança exige discussão com a sociedade ou aprovação no Congresso. O poder é todo do Executivo.

A própria LOA deve sofrer uma série de alterações em sua metodologia, encaminhadas pelo Governo no Projeto de Lei Orçamentária Anual 2013, ao Congresso Nacional no final de agosto. Essas alterações refletem ainda mais a intenção de generalizar o orçamento, o que impede um acompanhamento real das ações em andamento.

Na prática, os parlamentares federais estão abdicando de decidir e monitorar os recursos públicos, e assim prejudicam a sociedade como um todo. A pergunta que fazemos é se a Lei Orçamentária ainda vale alguma coisa ou se é uma mera formalidade, um cheque em branco do Legislativo para o Executivo. Nesse quadro, o controle social exercido pela sociedade e pelos movimentos sociais, que há décadas vêm investindo nessa área, é o maior prejudicado.

Histórico

Para os movimentos de mulheres e feminista, atuar no campo das finanças públicas e no monitoramento dos recursos destinados às políticas para as mulheres permitiu uma educação política de significado maior. Foi monitorando o gasto público que os movimentos de mulheres se apoderaram de informações importantes para sua incidência no campo das políticas públicas, passando a propor ações governamentais concretas. Essa atuação contribuiu para o entendimento de que as políticas públicas são um direito nosso, e não apenas uma decisão técnica do governo.

Até hoje, o Brasil era o único país do mundo com atuação nos orçamentos sensíveis a gênero, com acompanhamento diário feito através de dados oficiais da execução dos recursos, e ainda com acesso amplo e gratuito pelo portal do orçamento no Senado, o Siga Brasil. Agora, conquistas como o aumento do orçamento para as políticas da igualdade, promovidas tanto pela Secretaria de Políticas para as Mulheres quanto por outros Ministérios, e o fortalecimento da Bancada Feminina na Câmara d@s Deputad@s na discussão sobre os recursos destinados a políticas para as mulheres, estão seriamente ameaçadas a partir dessa nova metodologia. Nossa dura realidade é que, com as decisões tomadas até o momento, o Orçamento Mulher não sobreviverá como historicamente foi idealizado e desenvolvido.


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