Esse mês parece auspicioso. No horizonte do 8 de março, sempre iluminado pela luta das mulheres para transformar o mundo, está o desafio de democratizar o poder. A tarefa de mudar o sistema político (tão patriarcal e, por isso mesmo, tão avesso à presença das mulheres) é obra que vem sendo realizada pelas próprias mulheres e, salvo exceções que confirmam a regra, por raros homens.

Não houve direito, liberdade ou espaço de poder que as mulheres tenham ganhado de presente. As mudanças que conquistamos, expressas pelo reconhecimento de novos direitos e pela presença de algumas mulheres no poder, resultaram das nossas próprias lutas, da força do nosso movimento, da ousadia e coragem que exercemos a nossa cidadania e ocupamos novos lugares no mundo.

A eleição da primeira presidenta do Brasil sinaliza, sem margens para equívoco, que a maioria da sociedade brasileira decidiu derrotar preconceitos, romper com atos discriminatórios, machistas e misóginos. Nesse esteio, entre outras novidades, temos pela primeira vez uma mulher ocupando o lugar de titular na primeira vice-presidência da Mesa da Câmara: a deputada Rose de Freitas (PMDB-ES); e três mulheres na Mesa do Senado: a senadora Marta Suplicy (PT-SP) como titular na primeira vice-presidência, e Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM) e Maria do Carmo Alves (DEM-SE) como suplentes. São evidências de mudanças em curso na cultura política.

Contudo, ainda é arriscado dizer que esse processo vai desembocar em alteração da ordem patriarcal que estrutura o sistema político. As proposições que estão em debate no Congresso com vista à reforma política ainda negligenciam o fato que a exclusão das mulheres do poder é algo inaceitável numa democracia.

De todo modo, ficou provado que honrar as mulheres nesse país é um compromisso que mobiliza cidadania, para o espanto de todos os partidos políticos que, no último pleito, sem exceção, descumpriram a lei ao apresentarem muito mais candidaturas de homens do que os 70% a que tinham direito, e muito menos de mulheres do que o mínimo de 30% que deveriam cumprir.

De uma perspectiva feminista, o que queremos por em questão no debate sobre a reforma política é a própria noção de democracia, que foi reinventada desde que as mulheres se organizaram e começaram a lutar por seus direitos. A concepção patriarcal de origem, que não reconhecia as mulheres como sujeitos de direito e nem como sujeito político caiu por terra desde então.

Há 79 anos, o movimento das sufragistas lutou e conquistou o direito das mulheres brasileiras elegerem seus/suas representantes e de serem eleitas. Aprendemos, faz tempo, que é na luta que alcançamos nossos objetivos. E nela seguimos, pontuando o debate da hora sobre a reforma política com uma questão democrática incontornável: a exclusão das mulheres produzida pela estruturação patriarcal do sistema é política e eticamente inaceitável, e tem que ser desmontada.


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