Sempre foi difícil, no Brasil, assegurar o exercício de direitos sociais no dia-a-dia. Ultimamente, porém, a dificuldade tem sido garantir que esses direitos continuem existindo na lei. A tendência do governo a se opor a projetos de lei que regulamentam direitos constitucionais se soma ao apoio e à promoção de projetos e iniciativas que desobrigam seu cumprimento. Essa tendência, que responde a uma disposição global de desregulamentação dos direitos sociais e de presença mínima do Estado na vida das pessoas, veio se consolidando no Congresso Nacional durante o ano passado, e tudo indica que continuará atuando neste ano.

É nesse contexto que o governo emitiu, no apagar das luzes do Congresso, uma medida provisória (MP) regulamentando o direito ao seguro desemprego para os trabalhadores domésticos. O que aparentemente era uma boa notícia - e foi assim divulgada - logo se mostrou diferente. Em novembro o plenário do Senado havia acabado de aprovar o PLC 050/95, do ex-deputado Jackson Pereira (PSDB/CE), que estendia o direito ao seguro desemprego aos trabalhadores domésticos, e o havia remetido à sanção presidencial. A presidência, porém, optou por vetar o projeto e, no seu lugar, emitiu essa medida provisória, em outra direção. No projeto originalmente aprovado no Senado, o direito ao seguro desemprego estava garantido às domésticas. Pela MP, somente terão direito ao benefício, aqueles trabalhadores cujos empregadores optarem por recolher o FGTS (o que não é obrigatório).

No Congresso se avalia que esta medida está sendo um primeiro teste para que o mesmo teor venha a ser aplicado, posteriormente, a todos os trabalhadores regidos pela CLT: a vinculação do seguro desemprego ao recolhimento (facultativo) do FGTS. Uma medida assim desobrigaria empregadores de encargos sociais, vistos hoje não mais como direitos do cidadão, mas como custos que geram desemprego e impedem a modernização da economia. Seria, enfim, uma medida afinada com a tendência atual à "moderna" flexibilização das relações de trabalho.

A medida provisória do governo traz mais uma conseqüência dentro do Congresso: torna mais difícil a aprovação de um outro projeto que assegura direitos às trabalhadoras domésticas - o PL 1626/89, da então deputada Benedita da Silva (PT/RJ). O projeto já está desde maio aguardando a votação final no Plenário da Câmara (veja Fêmea nº 76) e, em dezembro, o deputado Michel Temer (PMDB/SP), presidente da Casa, assegurou que buscaria colocar o projeto na pauta da convocação extraordinária, em janeiro, o que acabou não acontecendo.

A articulação agora é com o movimento das trabalhadoras domésticas, para que se consiga por o projeto em votação. A dificuldade para a aprovação do PL 1626/89 agora é maior. Se antes já havia um consenso nas negociações, com a Medida Provisória em vigor o governo mostrou que não concorda mais com o projeto e será pouco provável que a base governista queira votá-lo em um ano eleitoral, pois teriam que rejeitar um projeto de interesse popular.


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