Efervescência e consolidação de ONGs feministas - 1993

As ONGs feministas surgiram na cena brasileira na década de 1980, chegando a dez em 1989 (ver vinheta de 1980) e totalizando dezesseis em 1993, com as seis novas organizações criadas a partir de 1990. Este grupo se articulava internamente através de projetos conjuntos ou da participação em encontros e atividades agregadoras da agenda feminista nacional e internacional. Suas atividades, de modo geral, estavam circunscritas à produção de informação, formação política feminista, educação para o empoderamento das mulheres e advocacy em direitos e políticas públicas, particularmente nos temas do combate à violência doméstica e sexual, saúde e direitos reprodutivos e combate ao racismo.

As ONGs brasileiras, de modo geral, foram se consolidando na medida em que renovavam projetos financiados pela cooperação internacional, numa interação que exigia processos internos de aprimoramento da estrutura administrativa e planejamento estratégico. A experiência com assessorias ou projetos específicos financiados pelo poder público constituíram outro fator para a institucionalização dessas organizações.

O cenário global apontava mudanças relativas à restruturação do capitalismo, com avanço do neoliberalismo e reformas do papel do Estado. Neste cenário, as principais agências financiadoras que operavam no Brasil promoveram diálogos com suas contrapartes para debater a conjuntura e traçar novas estratégias. ONGs feministas com maior trajetória neste universo participaram deste processo. Contribuíram estimulando o debate a partir da perspectiva de gênero - quando este conceito recém se disseminava - e colocando sobre a mesa as metodologias feministas de ação e gestão.

O Plano Collor e, em seguida, o deslanchar do ciclo de conferências sociais das Nações Unidas foram outros fatores de consolidação das ONGs.

As medidas financeiras do Governo Federal estimularam o mundo das ONGs a intensificar o diálogo interno para avaliar impactos e traçar caminhos para sua sustentabilidade e autonomia. Desse diálogo resultou a criação, em 1991, da Associação Brasileira de ONGs (Abong), formada por organizações comprometidas com a democratização, o combate à pobreza e todas as formas de discriminação e exclusão. A contribuição das ONGs feministas foi relevante, em particular no debate sobre o protagonismo das ONGs em sua relação com os movimentos sociais, o Estado brasileiro e o universo da cooperação internacional.

Também em 1991 criou-se a Rede Nacional Feminista de Saúde e Direitos Reprodutivos, liderada por ONGs feministas. No ano seguinte deslanchou-se o ciclo social das Nações Unidas, com a ECO ’92, que aconteceu no Rio de Janeiro. As feministas brasileiras protagonizaram este processo, tanto na organização do Fórum Global – conferência paralela que reuniu ONGs de todo o mundo no Aterro do Flamengo – como na produção de consensos e subsídios para o debate na conferência oficial. O mesmo aconteceu no processo para as conferências do Cairo (1994) e de Pequim (1995), onde a temática central era diretamente relacionada às questões e direitos das mulheres.

A efervescência das ONGs feministas se refletiu na construção de agendas preparatórias (com articulações regionais e internacionais), na incidência direta sobre a postura do governo brasileiro nessas conferências e nas ações posteriores de monitoramento dos compromissos assumidos. Foi do processo preparatório para Pequim que surgiu o embrião da Articulação de Mulheres Brasileiras, também protagonizada por ONGs feministas.

ONGs feministas criadas entre 1990 e 1993

  • 1990 – Casa da Cultura da Mulher Negra (São Paulo/ SP)
  • 1990 – Cidadania Estudo Pesquisa Informação e Ação - CEPIA (Rio de Janeiro/ RJ)
  • 1991 – Serviço à Mulher Marginalizada (São Paulo/ SP)
  • 1992 – Criola (Rio de Janeiro/ RJ)
  • 1993 – Católicas pelo Direito de Decidir (São Paulo/ SP)
  • 1993 – Themis - Assessoria Jurídica e Estudos de Gênero (Rio Grande do Sul/ RS)