Ex-presidente da UNE e filiada ao PCdoB, a economista Carina Vitral é hoje assessora da Secretaria-Executiva do Ministério da Fazenda

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Breno Esaki/Metrópoles
 

“Lutamos contra os cortes de verbas para educação e o ajuste fiscal, porque a gente acha que a saída da crise passa por mais investimentos nos gastos sociais e não menos investimentos”. Essa foi a frase usada pela então estudante de economia Carina Vitral em 2015, para apresentar as demandas que representava na Câmara dos Deputados, por parteda União Nacional dos Estudantes (UNE).

Hoje, a economista é assessora no Ministério da Fazenda, integrando a equipe do número dois da pasta, o secretário-executivo Gabriel Galípolo. Os dois são egressos da PUC de São Paulo e tiveram um diálogo durante a campanha eleitoral de 2022. No posto, ela é responsável pela articulação das pautas econômicas com os movimentos sociais.

“Os movimentos têm uma interlocutora que veio de lá e que vai abrir as portas para que as mulheres, as centrais sindicais, os trabalhadores, o movimento estudantil tenham voz também na política econômica”, disse Carina em entrevista ao Metrópoles. “Precisamos sair do economês e ir para a pauta do povo”, defendeu.

Há oito anos, Carina era ativa nas críticas ao governo federal e ao Congresso, que estudavam medidas para limitar o crescimento das despesas públicas, em um momento em que a crise fiscal dava seus primeiros passos.

Carina presidiu a UNE entre 2015 e 2017. Foi a primeira mulher antecedida e sucedida por uma mulher na história da entidade. Filiada ao PCdoB e autointitulada feminista, ela é próxima de expoentes da esquerda brasileira, como a correligionária Manuela D’Ávila.

“O feminismo é muito forte na minha geração e isso se refletiu também no movimento estudantil, para ser mais feminino e mais feminista”, afirmou Carina.

Do estacionamento ao andar do ministro

Além de pautas relacionadas a educação, ela defendeu no Congresso a manutenção da maioridade penal e a Lei das Cotas. Em outros âmbitos, organizou manifestações pela redução dos juros e contra o ajuste fiscal e participou de um acampamento no estacionamento do Ministério da Fazenda, bloco em que hoje dá expediente.

 

Naquele momento, o Banco Central (BC), hoje responsável pela definição da taxa básica de juros, a Selic, ainda não possuía autonomia.

Para Carina, é “muito natural” que figuras que atuaram na política nos últimos anos estejam hoje compondo os quadros institucionais do governo.

“Eu me preparei, também tecnicamente. Não sou só uma pessoa que fui líder estudantil”, frisa ela, que se formou em economia pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) em 2022. Atualmente, aos 34 anos, faz mestrado em políticas públicas e governo na Fundação Getulio Vargas (FGV).

 

“Em toda a minha vida, militante e acadêmica, sempre acreditei que a economia é política. São decisões políticas e econômicas que afetam a vida das pessoas e por isso são grandes instrumentos de transformação”, escreveu ela nas redes sociais no dia em que sua nomeação foi publicada.

Arcabouço fiscal

Para Carina, o novo arcabouço fiscal proposto pelo governo é “coerente” e “completamente diferente de um mero ajuste fiscal”. “É um arcabouço garantidor de direitos, garantidor de que a pauta que venceu as eleições (como o Bolsa Família, o Minha Casa, Minha Vida e os recursos para educação) estejam dentro da capacidade do governo de ter investimentos públicos”, avalia ela.

Em um país que tem deficit habitacional e que voltou ao mapa da fome, “é impensável você colocar como regra rígida um teto de gastos”, diz.

O novo instrumento, segundo a economista, vai conseguir unir a credibilidade de que o Brasil vai atender a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), ao mesmo tempo em que assegura políticas sociais eleitas.

“É um arcabouço muito crível, que pode ser realizável. Além de tudo, é uma política anticíclica”, sintetiza.

Sobre o “fogo amigo”, vindo de petistas críticos às regras fiscais proposta, ela acredita serem comentários pontuais. “Não representam a maior parte da base de apoio do governo. E bom, é um governo democrático, que está aberto a todo tipo de opinião.”

Ela entende que a base parlamentar não será construída “da noite para o dia” e a boa relação com o Congresso tem sido semeada desde a PEC da Transição. “O governo conseguiu retomar um diálogo republicano com a Casa, tem conseguido ter uma relação positiva com os dois presidentes das Casas, bem como com o STF. Eu confio na capacidade de interlocução do presidente Lula e da sua equipe.”

Trajetória

Natural de Santos (SP), Carina Vitral iniciou a militância política aos 12 anos. Participou do Conselho Municipal de Juventude da cidade de Santos, juntou-se ao movimento das ONGs locais e dirigiu o Centro dos Estudantes de Santos (CES).

O crescimento político no movimento estudantil veio com o cargo de diretora de universidades públicas da UNE, que ocupou entre 2011 e 2013, até ser eleita presidente da União Estadual dos Estudantes de São Paulo (UEE-SP). Através da UEE, foi conselheira da cidade de São Paulo, à época governada por Fernando Haddad.

No período em que esteve à frente da entidade estadual, foi conquistado o passe livre estudantil para ônibus, metrôs, trens e transporte intermunicipal, logo depois das Jornadas de Junho de 2013.

“Sempre fui uma jovem engajada nas lutas. Minha mãe fala que, desde muito cedo, eu tinha opinião política, era de esquerda, apoiava o Lula. Sempre foi uma coisa bem natural a política para mim, mas foi efetivamente na universidade onde eu comecei, no centro acadêmico, passando pelo diretório central dos estudantes e fui parar na União Nacional dos Estudantes”, disse Carina na entrevista.

Em meados de 2015, antes mesmo do impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff (PT), Carina e outras dezenas de estudantes acamparam em frente à sede do Ministério da Fazenda para protestar contra os cortes de verbas na educação em consequência do ajuste fiscal estabelecido pelo governo.

À imprensa, ela disse que o movimento dos estudantes ocorria em razão de o governo adotar como lema o “apoio à pátria educadora, enquanto corta recursos para a manutenção dos bandejões”.

O grupo ainda cobrava uma reunião com o então ministro da Fazenda, Joaquim Levy, visto com ressalvas pelo PT e por alas da esquerda.

Contrária ao impeachment da petista, Carina foi presença permanente nas manifestações em defesa da ex-presidente.

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“Amiga de presidentes latino-americanos”

Em uma das sessões que debatiam o impeachment de Dilma, Carina foi mencionada nominalmente pelo deputado federal Marco Feliciano (então no PSC paulista), que a chamou de “amiga de vários presidentes latino-americanos”.

“Durante as sessões que deliberaram sobre o processo de impeachment da Presidente Dilma Rousseff, vários representantes da UNE circularam por esta Casa, inclusive a Presidente Carina Vitral, amiga de vários presidentes latino-americanos, por coincidência todos de esquerda e arremedo de ditadores, com os quais orgulhosamente se exibe em fotos, com a única finalidade de intimidar e enxovalhar deputados que se manifestavam a favor do impeachment”, disse Feliciano em 10 de maio de 2016, segundo registro da sessão.

O deputado era um dos autores de pedido de instalação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para investigar a UNE, que acabou não saindo do papel. Na visão de Carina, a UNE foi escolhida como “alvo de perseguição política” pela bancada fundamentalista da Câmara, com o objetivo de intimidar a entidade.

Questionada sobre a crítica, Carina disse que, naquela época, foi formado “um batalhão de choque contra os movimentos sociais”. “Você imagina, uma líder estudantil jovem, mulher à frente da luta democrática, é óbvio que eu virei o alvo preferencial do Feliciano.”

Outro parlamentar que na época do impeachment fez críticas a Carina foi o falecido Major Olimpio (então no SD de São Paulo). Em sessão em abril de 2016, Olimpio disse no Plenário da Câmara

“Ela é a loirinha que estava emoldurando o Lula no dia em que houve a condução coercitiva, dizendo que a
juventude está com um bandido. Mas a juventude não está com bandido coisa nenhuma!”.

“Vejo essas críticas nesse sentido: como uma fase radical que o Brasil viveu”, diz ela, afirmando ter esperança de superação desse momento, com diálogo democrático. Ela acredita que temas inflados de extremismo irão perder espaço na era pós-Bolsonaro.

Por outro lado, ela recebeu homenagens de parlamentares de esquerda e foi convidada para reuniões de comissões da Câmara, como a de Educação.

Disputas eleitorais

Pelo PCdoB, Carina se candidatou nas últimas três eleições, sem sucesso. Em 2016, quando ainda presidia a UNE, disputou a prefeitura de Santos pela coligação entre o PT e o PCdoB, em uma eleição em que o partido de Lula deixou de lançar candidatura própria. Recebeu pouco mais 14 mil votos (6%), ficando na segunda posição, derrotada pelo prefeito Paulo Barbosa (PSDB), que buscava a reeleição.

Já em 2018, foi candidata a deputada estadual, também pelo PCdoB de São Paulo. Recebeu pouco mais de 33 mil votos (0,16%), ficando com a primeira suplência do partido.

No último pleito, de 2022, foi novamente candidata a deputada estadual. Recebeu 22 mil votos e não foi eleita.

 

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