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Em princípio, o ecofeminismo é uma teoria e um movimento social que relaciona a subordinação e a opressão das mulheres com a exploração e destruição da natureza, e sustenta que, para alcançar a justiça para as mulheres e toda a sociedade, é preciso transformar também a relação humana com os outros seres vivos e o meio ambiente. Consultadas por Carbono News, três ecofeministas de diferentes esferas contaram como se relacionam com o ativismo comumente chamado de “ambiental” e explicaram qual é a importância deste movimento e seus desafios atuais na Argentina.

A reportagem é publicada por Infobae, 25-03-2021. A tradução é do Cepat.

Rosalía Pellegrini é camponesa e é a coordenadora da Secretaria de Gênero da União de Trabalhadores da Terra – UTT, uma organização de famílias produtoras e camponesas que produzem alimentos agroecológicos, sem venenos. No seu caso, disse que não estudou livro algum sobre ecofeminismo, mas que sua própria realidade foi demonstrando-o.

“Nós nunca dissemos ‘somos ecofeministas’, nem lemos livros sobre o assunto, pelo contrário. Na realidade, nós, trabalhadoras camponesas, começamos a nos reunir, há cerca de dez anos, para refletir sobre nossas vidas, nosso trabalho, nosso papel no sítio, na roça, e sobre o uso de nosso tempo, como nas tarefas de cuidado, e isso foi levando à formação da Secretaria de Gênero da UTT”, afirmou.

Em uma das conversas com outras mulheres, uma companheira disse: “O dano causado à natureza, é o mesmo causado a nosso corpo, é a mesma violência”. “E leu isso em um livro?”, perguntou. “Não. É o que vivemos todos os dias, quando aplicam agrotóxicos na roça e nossos filhos adoecem, perdemos uma gravidez, vemos que cada vez as famílias estão mais endividadas, e o endividamento gera problemas de alcoolismo, violência”, detalhou.

Secretaria, que tem cinco anos de vida, foi formada por causa de situações de “violência física grave”, explicou Pellegrini, e acrescentou que essa violência também se vê refletida no território e na economia pelo atual modelo de agronegócio. “Nós o relacionamos com a violência econômica, com esse modelo que gera dívida, crise na família e que nós, mulheres, acabávamos carregando em nossos ombros, como podíamos, a escassez econômica, os problemas na família e a contenção no lar”.

Para a camponesa da UTT, não existe diferença entre o ativismo ambiental e o ecofeminismo: “Não estamos muito preocupadas com as classificações”, argumentou, acrescentando: “Se o ecofeminismo fala em valorizar a visão e a perspectiva de cuidado que nós temos sobre o território, defendendo que a relação com a natureza não seja de dominação, mas de respeito e reciprocidade, isso é o que fazemos, é a proposta de agroecologia da UTT”.

Neste sentido, acrescentou que as mulheres camponesas entendem que o que estão produzindo não é uma mercadoria, mas um alimento que os pequenos vão comer. “Essa conscientização do cuidado da família e a comunidade está presente e é o que impregna nossa visão sobre a transformação do modelo produtivo para um esquema de desenvolvimento que não acarrete dano à natureza, porque nós somos natureza”, acrescentou Pellegrini.

“O ecofeminismo considera que não tem como desconstruir o patriarcado, caso não se questione simultaneamente um modelo capitalista extrativista e que acentua que o modelo atual não seria possível sem a exploração das mulheres que são invisibilizadas, e sem a exploração da natureza”, afirmou María José Lubertino, professora e advogada feminista, presidenta da Rede de Defensoras do Meio Ambiente e o Bem Viver.

E acrescentou: “O mesmo que acontece com o trabalho doméstico invisibilizado e não contabilizado como um custo no sistema, acontece com a natureza, e assumem como infinitos os bens comuns, os bens naturais, que são explorados para além dos limites da própria possibilidade de regeneração da natureza”.

Neste sentido e, concordando com PellegriniLubertino explicou que há uma “visão errônea” de que, a partir da exploração da natureza, a América Latina pode avançar. “Isso é uma dupla falácia”, sentenciou, e explicou que, desse modo, não somente são destruídos os ecossistemas, como também não são solucionados os problemas econômicos, nem os sociais.

Lubertino enumerou alguns dos problemas ambientais que mais atingem a Argentina: o avanço da exploração das matas, a poluição da água com agrotóxicos e também pela megamineração, e as grandes barragens de hidrelétricas. “As mulheres estão na linha de frente da resistência a estes projetos extrativistas, sobretudo mulheres dos povos originários, camponesas, e depois muitas mulheres urbanas, pois o extrativismo também pode ser urbano”, disse Lubertino.

Sobre a relação entre “feminismo” e “ecofeminismo”, destacou: “Acreditamos que o feminismo vai ganhando cada vez mais consciência de que deve ser ecofeminista, porque não queremos que se empodere mulheres que reproduzam o mesmo que os homens fazem com o extrativismo”. E acrescentou: “Hoje é consubstancial ao feminismo entender que não é possível lutar contra o patriarcado, sem simultaneamente questionar o modelo extrativista”.

“O ecofeminismo não é simplesmente oferecer perspectiva de gênero aos projetos de desenvolvimento urbanísticos e aos processos produtivos, mas implica uma mudança de paradigma que busca a harmonia com a natureza, justiça de gênero e justiça social como três dimensões de uma mesma causa”, concluiu.

A ativista e fundadora de XR Extinction Rebellion MisionesSofía D’Arpino Wall, disse ao Carbono News, em 2020: “Quando falamos de justiça ambiental, falamos de justiça social com perspectiva de gênero, não é possível separar, nem existir uma sem a outra”.

“Na maioria das comunidades do planeta, as mulheres são invisibilizadas, isoladas, exploradas, abusadas”, acrescentou. “Justamente pelo sistema patriarcal que sofremos, os efeitos da crise climática e ecológica prejudicam diretamente as mulheres que trabalham nas terras, por exemplo. Assim, vemos que também no ativismo ambiental a violência e a perseguição recaem principalmente em nós, às vezes, até nos mesmos espaços”, avaliou.

É que nem os próprios espaços de ativismo ambientalista estão livres da violência machista. Pellegrini contou que “a UTT é uma organização rural com uma perspectiva feminista”, mas que mesmo assim dentro dos espaços existem “os machismos” e, por isso, em 2020, criaram um protocolo interno contra a violência de gênero.

“Resta um montão de trabalho, sobretudo na sociedade em seu conjunto, para que os homens assumam essa transformação das masculinidades violentas”, acrescentou.

O início do ecofeminismo e suas referências mundiais

Conceitualmente, o ecofeminismo foi formulado por Françoise d’Eaubonne (Paris, 1920-2005), uma escritora feminista francesa que usou o termo écoféminisme e desenvolveu os primeiros escritos sobre o tema nos anos 1970, quando estava no auge a segunda onda feminista e o ecologismo ganhava impulso.

Algumas das referências internacionais são as estadunidenses Carol AdamsKaren Warren, a australiana Val Plumwood, a alemã Petra Kelly e a indiana Vandana Shiva.

A queniana Wangari Maathai (1940-2011) foi a primeira mulher africana a receber o Prêmio Nobel da Paz, em 2004, por ter iniciado o Cinturão Verde do Quênia, encarregado de plantar milhões de árvores para deter a desertificação na África.

Na América Latina, uma das mais reconhecidas foi Berta Cáceres, uma líder indígena lenca hondurenha que foi assassinada em 2016 por defender seu território contra o avanço extrativista.

 

Leia mais

 

fonte: https://www.ihu.unisinos.br/categorias/607930-o-que-o-ecofeminismo-postula

 

LEIA também, de Graciela Rodriguez: ECO-FEMINISMO – SUPERANDO A DICOTOMIA NATUREZA/CULTURA


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